domingo, 21 de março de 2010

A passear o cão

Dantes a desculpa era a de ir comprar tabaco. Agora, com os cigarros cada vez mais fora de moda, a nova desculpa é a de ir passear o cão. Na versão clássica, comprar tabaco significava que se ia e não mais se voltava. Na versão moderna, ir passear o cão (dogging, em Inglês), é código para outro tipo de escapadela.


Aparentemente, um dos mais recentes desportos ao ar livre dos Britânicos é o sexo praticado em locais públicos, como parques de estacionamento ou áreas de picnic, à vista de observadores que podem ou não ser convidados a participar. Nele envolvem-se indivíduos e casais heterossexuais que dessa forma tem a possibilidade de experimentar actividades sexuais livres de compromisso com estranhos.


Para quem leu o altamente explícito mas monótono livro “A vida sexual de Catherine M.” de Catherine Millet, sabe que não se trata propriamente de coisa nova. De acordo com a autora, Paris e arredores são (ou já foram) férteis nesse tipo de orgias ao ar livre.


Hoje em dia, porém, o fenómeno é alimentado pela utilização da Internet para divulgar os locais em que o dogging ocorre e para angariar mais adeptos, pelos vistos com sucesso. Existem sítios especializados com listas de milhares de interessados nesse fenómeno. Além disso, algumas pessoas usam SMS para espalhar a palavra sobre onde vão estar a uma certa hora. Assim tornam a festa muito mais fácil e concorrida.


Aparentemente o dogging tem vindo a ganhar adeptos em países como o Brasil, o Canadá ou a Polónia. Da forma como actividades sexuais mais ou menos ilícitas depressa se tornam populares, não é de estranhar que em breve se trate de mais um fenómeno global.


Um dos aspectos interessantes dessa prática é a forma como ela esbate a fronteira entre público e privado. Dantes o sexo era coisa que se fazia na privacidade do quarto, cozinha ou corredor (de casa, entenda-se). Agora é feito no focinho de toda a gente. E, como se não bastasse, é comum utilizarem-se câmaras e telemóveis para registar imagens de tais eventos que são depois distribuídas pelo ciberespaço.


Se a pornografia sempre se dedicou à divulgação de imagens sexualmente explícitas para quem as quisesse comprar, parece agora ser moda a produção artesanal desse material que depois se põe ao dispor dos olhares mais indiscretos. Basta consultar alguns dos sítios especializados na rede para potencialmente se encontrar o vizinho, o patrão ou a senhora da papelaria nas poses mais escabrosas.


Estará a tecnologia a criar novas formas de explorar a sexualidade? Ou será que os potenciais exibicionista e sexualmente polimorfo sempre estiveram escondidos nas profundezas obscuras do ser humano apenas para agora encontrar as condições ideais para florescer? Isso é o que iremos descobrir nos próximos anos.

 
Publicado na Revista Pública de 02/11/2008

Sem comentários:

Enviar um comentário