quarta-feira, 26 de maio de 2010

Padecimentos de Vénus



Mal sabia Vénus que o seu nome iria ser usado e abusado pelos comuns mortais. Pensaria lá a deusa do amor que se iriam chamar de venéreas a uma série de doenças muito pouco simpáticas. Pois durante muito tempo foi esse o nome que se lhes deu, decerto para desagrado da deusa. Hoje em dia, porém, já está fora de moda falar de doenças venéreas, assim como já não se usa a expressão “doenças sexualmente transmissíveis”.

Na designação mais moderna de infecções sexualmente transmissíveis, existe agora uma mensagem escondida. É que as doenças tanto podem dar um ar irritante da sua graça como armar-se em agentes secretos ao serviço de nenhuma majestade e muito menos de Vénus. Divertem-se saltitando levemente de nenúfar em nenúfar, qual elefante numa loja de porcelana, deixando a sua marca em quem sem querer se torna num lar para hóspedes indesejados.

É que quando alguém está doente, pensamos em ranhoca e olhares febris, em gente descabelada e a queixar-se de ter a cabeça quase a explodir. Pessoas assim estão doentes para lá de qualquer dúvida. Porém, uma pessoa infectada também tem uma doença mas pode, ao mesmo tempo, ter uma aparência saudável, dentes reluzentes e passar horas a exercitar-se vigorosamente no ginásio.

A mensagem escondida da mais recente designação atribuída às enfermidades de Vénus é, assim, uma que realça a ideia de que o aspecto de uma pessoa não diz nada sobre o seu estado de saúde. Pretende alertar os mais distraídos que poderão achar que o bronze ou o corpinho bem-feito são prova suficiente de que o seu parceiro sexual nunca poderá estar doente.

Mesmo uma mera gripe, que para muitas pessoas não será motivo suficiente para suspender a sua vida sexual, poderá ter muito que se lhe diga. Cerca de 80% das pessoas recentemente infectadas com o VIH desenvolvem uma infecção aguda, cerca de duas a quatro semanas após a exposição ao vírus. Os sintomas dessa infecção podem ser dores de garganta e de cabeça, fadiga, perda de apetite, febre, entre outros. Não é por acaso, por isso, que muitas vezes essas infecções passem despercebidas, levando a que se percam oportunidades de diagnóstico e tratamento precoces.

O problema é que, durante a infecção aguda, o portador do VIH é muito mais infectante. Quer isso dizer que as probabilidades desse indivíduo infectar alguém com quem mantenha uma relação sexual são muito maiores do que mais tarde, na fase “invisível” da doença. Como o VIH e doenças afins só acontecem aos outros, uma pessoa que se infectou recentemente não irá fazer grande coisa em relação à sua “gripe” e porventura passar os seus bichinhos a terceiros, sem o saber. É que infelizmente, às vezes, uma gripe não é apenas uma gripe e Vénus pode também ser deusa de coisas menos boas do que o amor.

Originalmente publicado na Pública de 14/09/2008

terça-feira, 11 de maio de 2010

É tão bom, não foi?

Os dois amantes estão juntos num qualquer recanto confortável de uma casa. A cena começa com abraços e beijos, aconchegos suficientes para despertar uma certa vontade. Antes que o Diabo esfregue o olho, já as roupas estão a ser atiradas pelo ar. Sôfregos de antecipação, rebolam pelo tapete, dão encontrões nos móveis, partem duas jarras e deitam ao chão um porta-bengalas.

Porém, assim que as coisas aquecem mais um pouco, ele começa a respirar de forma ofegante. Mais ofegante do que seria esperado. E passados uns momentos, não sem ponta de embaraço, acaba por dizer: “Já terminei…”

Antiga como o homem, a ejaculação prematura só muito recentemente passou a ser considerada gente. Que é como quem diz, que só há umas tantas dezenas de anos se decidiu que tal precocidade orgásmica seria digna de nota nos anais da sexologia. E não por acaso.

Até há bem pouco tempo não se esperava que as mulheres tivessem prazer. Interessava que os senhores tivessem a oportunidade de, por assim dizer, descarregar a sua tensão acumulada e que, para isso, as senhoras suas companheiras estivessem sempre disponíveis. Assim, se o homem demorava 10 segundos, 3 minutos ou duas horas (situação eventualmente rara) no acto, tal não interessava para nada. Interessava sim que eles, machos, vissem satisfeitas as suas necessidades.

O mundo mudou e, mais ou menos de repente, as mulheres começaram, surpresa das surpresas, a ter prazer sexual. Mais do que a ter, passaram a exigi-lo. A satisfação sexual feminina e os orgasmos, se possível múltiplos, tornaram-se numa comodidade como outra qualquer que se compra no supermercado e sem a qual não se pode passar.

Que as coisas não podiam continuar como estavam, toda a gente sabia. Porém, os homens ainda não se tinham apercebido da situação bicuda em que se encontravam e foram apanhados com as calças nas mãos. Em alguns casos, literalmente. E assim surgiu a necessidade de criar uma nova categoria de perturbação sexual: a ejaculação precoce. Sinal dos tempos.

A ejaculação precoce pode ter causas orgânicas, por exemplo, nos casos em que surge devido a uma infecção urinária masculina. Mas essas são uma minoria. Mais das vezes é causada por factores de ordem psicológica, como a ansiedade face ao coito, ou a simples incapacidade de controlar a excitação naqueles momentos fulcrais do início (ou, por vezes, ainda antes) da relação sexual. Um caso sério de qual é coisa qual é ela, que antes de o ser já o era. Uma chatice.

Apesar das suas origens essencialmente psicológicas, os homens que ejaculam com excessiva sofreguidão não controlam a sua resposta sexual mais do que conseguem controlar a bolsa de Nova Iorque. E fazer contas de cabeça, pensar sobre a fome em África ou noutras calamidades pouco excitantes, não são soluções. Existem sim outras formas mais eficazes e construtivas para lidar com a síndrome do pénis apressado. Inclusive surgiram recentemente medicamentos que podem dar um empurrão para que a coisa não se precipite.

Além disso, existem técnicas que podem ajudar o homem a calibrar o seu membro, para que seja ele, o homem, a controlar o dito, e não o contrário, como já tantas vezes acontece noutros contextos. Através de exercícios bastante simples, pode o homem aprender a parar enquanto é tempo e a ser mais contido quando tal é desejável.

Importa perceber que essa é uma situação que afecta ambos os elementos do casal e que ambos devem estar envolvidos no processo de recuperação. Para que os pénis e respectivos donos possam continuar a ser fonte de prazer e não de dores de cabeça.