sexta-feira, 23 de julho de 2010

Machos alpha e beta

É sabido que os humanos são assim espécie de animais, ainda que com a mania de serem melhores do que os outros. Gostamos de pensar que o nosso intelecto nos coloca numa posição sobranceira a crocodilos, pardais e muitas espécies de bivalves. A verdade é que ao mesmo tempo somos e não somos superiores a tais bichos. A nossa sofisticada mente permite-nos fazer coisas como jogar xadrez e ler a Pública enquanto ouvimos a 9ª de Beethoven no leitor de MP3. Mas no fundo, continuamos a ser animais com comportamento em muitos aspectos semelhante ao de outras espécies. Exemplo disso é a existência entre humanos de machos alpha.


Em certas sociedades animais, como as dos lobos ou dos chimpanzés, existe um macho dominante. Esse é o líder que é respeitado pelos restantes, nem que seja porque se não o fizerem apanham pancadaria da grossa. Esse macho é também aquele que tem maiores hipóteses de crescer e multiplicar-se por ter acesso privilegiado às fêmeas. A esse elemento dá-se o nome de macho alpha.


Entre humanos, tornou-se comum chamar machos alpha aos homens que de alguma forma são líderes naturais. Mesmo os que na maior parte das vezes não têm que dar dentadas aos outros para conseguirem ser bem sucedidos. Darão eventualmente dentadas virtuais, uma vez que muitas vezes são agressivos na sua actuação. São, de resto, bem sucedidos entre as mulheres pela aura de poder físico ou económico que emanam.


À criatura que assume a posição de braço direito do macho alpha dá-se o nome de macho beta. Esse é o apaziguador, o que provou lealdade e mereceu confiança do seu líder. É o comunicador que resolve com diplomacia os problemas bicudos que o outro não consegue resolver à sua maneira. O típico homem beta é sensível e um comunicador nato.


Nas recentes eleições norte-americanas, um dos tópicos de discussão em alguma comunicação social foi o facto de que, enquanto McCain tinha todo o perfil de macho alpha, acabou por ser um macho beta, Obama, a ganhar a corrida. É certo que Bill Clinton já tinha características beta. Mas como se provou mais recentemente, parte da sua força provém da sua associação com Hillary. Assim, à semelhança de algumas sociedades animais, os Clintons são um perfeito par alpha, que será interessante observar agora dado o novo cargo de Hillary.


Numa época em que os machos beta andam por aí e em que as suas características são valorizadas, o novo líder do país mais poderoso do mundo é ele também um macho beta. Não nos devemos esquecer porém que Sara Palin contribuiu bastante para a derrota de McCain, em grande medida por ser um bom (mau) exemplo de fêmea alpha. É que se ser homem e sensível é agora valorizado, ser mulher e agressiva, ainda não o é. E isso diz muito sobre o mundo em que vivemos.

Publicado na revista Pública de 08/01/2009

sábado, 3 de julho de 2010

Calores de Verão




O Verão, as altas temperaturas e os destinos tropicais encontram-se associados no nosso imaginário à licenciosidade e à devassidão. No bom sentido, claro. Existe a ideia de que à medida que o mercúrio dos termómetros sobe, também os nossos barómetros de desejo subirão de forma incontrolável, deixando-nos vítimas de desígnios superiores a nós.


Mas será que existe de facto uma relação entre temperatura e sexualidade? Terá a ciência moderna comprovado essa realidade meia inventada pela mente perversa do senso comum? Na verdade as investigações sobre esse tópico são ainda relativamente inconclusivas.


Um dos indicadores que tem sido utilizado para avaliar a relação entre calor e sexo tem sido a incidência de violações ao longo do ano. Ao contrário das relações sexuais que ocorrem provavelmente aos milhões todos os dias em todo o mundo, dessas outras infelizes ocorrências existem registros que podem ser contabilizados. A maioria das investigações indica que é por finais do Verão, concretamente em Setembro que em países do Hemisfério Norte ocorrem os picos de violência sexual. Porém, certo é também que outras formas de violência, como guerras ou actos violentos não-sexuais, têm igualmente um pico por alturas de fins de Verão. Tal pico parece coincidir com o aumento sazonal da testosterona nos homens, hormona associada com a sexualidade e com a agressividade.


Os dados relativos à incidência de infecções sexualmente transmissíveis apontam mais ou menos para o mesmo, ou seja, para que há mais pessoas a portarem-se bem mal no final do Verão ou início do Outono. Por sua vez, os estudos sobre nascimentos indicam que a maioria das concepções terão lugar no Inverno.


De acordo com todos estes dados, todos parciais e limitados, parece que afinal o Verão não é mais do que uma boa campanha de marketing ao sexo, o outdoor que levará os consumidores, poucos meses mais tarde, a um certo consumo desregrado. Certo é que no Verão os corpos se expõem, sugestivos e oferecidos. As pessoas estão mais frequentemente de férias e, logo, com mais tempo para o sexo. O mesmo se passa nos países próximos do equador, para onde se vai descansar e divertir, e em que o próprio ritmo de vida será mais propício aos prazeres da carne.


A biologia certamente que ainda ditará muito do que somos e fazemos. Porém, o Homem consegue ser suficientemente criativo para ultrapassar as suas aborrecidas limitações biológicas. Em tempos remotos os nossos antepassados terão sido condicionados nas suas fúrias reprodutivas por períodos de cio. Para alguma coisa terão servido uns bons milhares de anos de evolução. Se hoje em dia por vezes achamos que não temos tempo para o sexo, pelo menos temos a grande vantagem de o poder gozar em qualquer altura do ano.

 
Originalmente publicado na Pública de 31/08/2008